“Comunicação” pode ser entendida como a relação entre o interlocutor, que emiti uma mensagem e o receptor, que a recebe. A relação pode parecer simples, mas está longe de ser. Receber a informação corretamente, não é tarefa simples, eu diria que é extremamente complexa. O primeiro complicador disso, a meu ver, é a língua. Por mais parecido que seja para um leigo, um chinês não vai entender um japonês se não souber japonês e vice-versa.
Quem nunca cometeu uma gafe com os famosos “false friend”, tanto no inglês quanto no espanhol, ao adotar uma palavra semelhante do português, achando que está abafando... Ou mesmo com o português de Portugal. O pedido de simples pãozinho de um português para um brasileiro, pode gerar muita confusão...
Isso porque, infelizmente, em grande parte das vezes não ouvimos o que o outro tem a nos dizer de fato. No caso da língua, precisamos aprender a língua falada pelo interlocutor, para poder compreender fidedignamente. É como se diante de uma mensagem desconhecida, nosso receptor editasse a informação a partir do referencial que temos, de forma que nossa compreensão fica distorcida: não ouvimos o que a pessoa de fato fala, mas o que podemos ouvir naquele momento. No caso do pão, o pedido por ser ouvido como uma tremenda ofensa.
Esse mesmo descompasso entre diferentes línguas faladas acontece com pessoas que falam a mesma língua. Pois é, quem nunca vivenciou uma situação constrangedora na qual não ouviu de fato o que outro falou, mas uma coisa complemente diferente? Aquela brincadeira de criança, o “telefone sem fio” ilustra bem o que estou tentando falar: a história começa com avião e termina com navio. A mensagem, ao passar de ouvido em ouvido vai sendo distorcida e cada uma vai compreendendo do jeito que pode e dificilmente chega no último, como de fato começou.
Acho que minha reflexão está filosófica de mais, deixe-me ilustrar com meu almoço para ficar mais fácil de entender. Fui almoçar em um restaurante japonês com uma amiga. Quando estava terminando a sobremesa o garçom veio perguntar se queríamos um café ou um banchá. Naquele instante achei que estava ouvindo uma coisa absurda: “estou terminando minha sobremesa e o cara vem oferecer aquela sopinha...” No momento em que ouvi, meu digníssimo cérebro processou “banchá”, que é o famoso chá verde, digestivo, ótimo após a refeição, com o missoshiro, que daí sim é a sopinha. Assim que o garçom ofereceu, a imagem que se formou em minha mente foi do potinho de sopa. Na hora, cai na tentação de julgar o garçom como um louco sem noção, que alias estava fazendo seu trabalho muito bem feito, simplesmente porque tinha ouvido errado o que ele havia oferecido. A única louca sem noção nessa história: eu. Logo caí em mim, graças a deus alias, pois se tivesse falado o que havia pensado, seria uma gafe daquelas... rs
Tirando o mico da experiência, acho que ilustra muito bem o que tentei explicar com “confusões” geradas pela forma como nos comunicamos. É um exemplo bobo, mas nos remete a pensar em tantas outras ocasiões, nas quais não conseguimos ouvir o que de fato o outro tem a nos dizer.
Nas relações de trabalho isso é extremamente comum. Já perdi as contas do número de vezes que ouvi pacientes se queixando do chefe porque fez a tarefa, mas não ficou do jeito que ele queria. Exemplo: o chefe pede que se “faça um relatório”; a pessoa ouve e a imagem que se processa em sua mente é de um lindo gráfico, condensando todas aquelas informações de forma colorida, o que a pessoa faz. Daí, ela vai feliz e contente apresentar o resultado de seu trabalho ao chefe, que dá um esporro danado por que não foi aquilo que pediu... O que acaba por gerar desconfortos, incompreensão e mal entendidos.
Por isso a importância de alinhar as expectativas: o que o funcionário entende por relatório, pode ser completamente diferente da compreensão do chefe. Portanto, para beneficio de ambos, vale a pena checar. Falar a mesma “língua” é bastante indicado nesse caso.
Nunca canso de dizer: sempre que ouvir algo, cheque se compreendeu corretamente, não a partir do próprio referencial, mas sim do referencial do interlocutor: “me vê um pãozinho no português de Portugal”, ouvido corretamente, só quer dizer “me vê um pãozinho” ... Alinhe a informação que recebeu com quem a falou. Exercício como esse pode ser surpreendente. É melhor pecar pela checagem do que correr o risco de entender completamente errado e precisar passar por um mico tremendo, ou ter que fazer a mesma coisa mais de uma vez. Enfim, exemplos, são inúmeros...
Lilian Loureiro